domingo, fevereiro 19, 2006

Todos moram no oitavo andar...

Há uns três meses moro num apartamento. É o nono andar do prédio e, excetuando-se o fato de que é preciso muita cautela ao sair de cueca por aí sem que ninguém dos prédios vizinhos perceba qualquer coisa, é um lugar bacana. O condomínio que parece ter mais seguranças do que moradores é composto por dez blocos no total. Cada bloco tem dez andares, isso contando o térreo como "primeiro andar" e cada andar tem quatro apartamentos. Se fizermos um conta por alto e supormos que em cada apartamento vivem cerca de quatro pessoas poderíamos facilmente supor que a população total do condomínio seria de aproximadamente mil e seiscentos condôminos.
Curiosamente, uma série de coincidências vêm acontecendo no meu prédio. Coincidências essas relacionadas ao oitavo andar. Parece absurdo mas é estranho.
Sempre quando se entra no prédio é preciso aguardar o elevador no hall, que também é o "primeiro andar". Acima da porta fica uma tela mostrando em que andar está o dito elevador. Estranhamente o mostrador sempre marca "8". Mas não é só isso. Várias vezes em que pego o elevador para descer, ele para no oitavo andar e sempre entram pessoas que eu nunca vi no prédio. Fora as vezes em que entro no elevador junto com alguém no "primeiro andar" e a pessoa aperta justo aquele botão ao lado do meu: o oito.
Afinal, o que acontece com esse oitavo andar?
Poucas vezes vi alguém subir ou descer fora dele. Uma vez tive que ajudar um moça, que parecia uma aeromoça, devida sua mala e o uniforme, e ela subiu exatamente no oitavo andar. À época eu nem tinha notado para tamanha coincidência ainda. E o pior: eu nunca vejo essas pessoas novamente. Essa aeromoça, por exemplo, nunca mais. São sempre diferentes. Há um detalhe que me esqueci de relatar. O oitavo andar sofre dum problema na porta do elevador. Eu não sei o que é. Só sei que ele de vez em quando não pára no andar e vai para o seguinte que o chama. Uma vez cheguei no hall e esperei pelo elevador. Dessa vez ele estava no quinto andar. Quando a porta se abriu, saíram dois sujeito e um outro continuou lá dentro. Ao entrar eu gelei. O botão apertado era o oito. Apertei o nove.
Subindo.
Subindo.
Quando chegou no oito o elevador parou e depois continuou até o nono. E o cara do meu lado começou a esmurrar (não tão agressivamente quanto a palavra conota) o número oito dizendo "Já é a segunda vez!" e eu num apoio singelo disse "Esse oitavo nunca pára!" e saí percebendo que ele não entendera o que havia dito. Pensando bem, deveria ter sugerido que ele fosse pela escada. Afinal era só um andar.
Detalhe: nunca vi esse cara no prédio e nunca mais o vi.
É tudo muito estranho.
Ontem ao chegar em casa cruzei o portão do condomínio junto com um homem. Ele foi na mesma direção que eu. Entrou no mesmo prédio.
Ele chamara o elevador que, gelem, estava no oitavo. Ficamos parados no hall esperando. Enquanto não vinha fiquei reparando o quão feio são esses tapetes que colocam na frente das portas. A porta abriu.
O meu coração no pescoço. Ele ia apertar oito.
Seu braço foi em direção ao número e perguntou pra mim meio que em câmera lenta, sabe, quando a voz dele fica mais grossa, lenta e distorcida que nem nos filmes "Que andar?" e eu respondi sem tirar os olhos do número oito "Nove".
Ele apertou e foi em direção ao número. Meu coração batia. Tum tum... Tum tum...
Agora minha teoria seria comprovada.
Ele apertou o dez.
Uma sensação de alívio e frustração tomou conta do meu ser.
O elevador subiu.
Subiu. Subiu.
Chegou meu andar. "Boa noite" disse eu.
"Boa noite"
Talvez seja tudo paranóia. Meras coincidências.
Peguei minha chave. Liguei a luz do hall do "nono andar" e abri a porta.
Mas quando fui dormir uma observação ocorreu-me.
"Nunca vi ninguém descer no décimo andar, aliás, nunca vi ninguém do décimo andar..."
E dormi. Um olho no teto e outro no chão.
"O que será que eles estão planejando?"