segunda-feira, agosto 21, 2006

a coisa

...aos pseudo-românticos...

Fale com ela. Pergunte o nome dela. Sei lá!
Pegunte as horas! Isso! As horas.
Todo mundo pergunta as horas para estranhos na rua. Mas espere, ela não tem relógio.
Droga!
Pense! Pense!
Como começar uma conversa assim de repente?
Só queria ouvir a voz dela.
É fato primordial que a personalidade de uma pessoa está intrinsecamente ligada à sua voz. Seja ela, grossa, aguda ou leve.
Há de se convir que certas vozes não combinam nada com as pessoas que as pronunciam.
Mas é regra: conhece-se muito de uma pessoa somente pela voz.
Nunca fui de reparar nessas coisas, mas de um tempo pra cá tenho apurado meus sentidos. Às vezes aquela pessoa magistral, sem igual, aparece na sua frente e você fica sem reações. Daí ela começa a falar e lá se vai o encanto.
Isso porque ainda não falei do discurso, que também é fundamental.
Nem sempre um voz bela carrega um discurso que seja tão belo quanto a mesma.
Estava lá! Olhávamos distraidamente um para o outro.
Creio que eu olhava, ela só passava os olhos sem nenhum interesse.
Alguns encontros de olhares fugazes que culminavam em outros olhares constragidos para o chão.
E a voz dela? Será aguda? Irritante? Doce? Suave?
Vozes! Maldita maldição!
As pessoas deviam ser mudas! Deviam se comunicar somente por olhares, gestos e toques...
Para que vozes?
Tudo seria silêncio. Tudo seria sublime.
Ela já vai sair. E vou morrer sem saber se tinha uma voz agradável para mim.
Tomarei uma medida drástica. O clima. Sempre recorra ao clima caso não tenha o relógio. É ridículo, entendo, mas é a única chance.
"Por favor, poderia me informar as horas?" disse ela.
Destino. Criatura irônica. E como gosto dessa ironia.
Quando vi que a boca dela se mexia, quando ouvi os sons, pude então satisfazer minha vontade.
Esqueci do silêncio. Esqueci tudo.
E reparei que amor não é só coisa que se sente.
É também coisa que se ouve.
Sublime.